BNZ em foco
O Código de Defesa do Consumidor e os Custos do Lazer - Abusividade ou Transparência na Cobrança
27/03/2019
Recentemente, foi julgado o recurso da Associação de Defesa dos Consumidores do Rio Grande do Sul contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado que reconheceu a ilegalidade da cobrança da taxa de conveniência para ingressos comprados pela internet em sites de eventos (REsp nº 1737428).
A decisão, proferida pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, cuja relatoria é da Ministra Nancy Andrighi, deu provimento ao recurso da Associação, declarando ilegal a cobrança da referida taxa de conveniência, bem como determinando aos consumidores a devolução dos valores cobrados nos cinco anos anteriores (2008) ao ajuizamento do processo (2013).
A Relatora entendeu que a taxa não poderia ser cobrada dos consumidores pela mera disponibilização de ingressos em meio virtual, por entender que se trata de venda casada (artigo 39, I, do CDC), bem como transferência indevida do risco da atividade comercial do fornecedor ao consumidor.
A Ministra, ainda, fundamenta sua decisão de forma que, o consumidor, quando opta por adquirir seu ingresso de forma online não teria direito de escolha, pois apenas uma empresa os disponibiliza.
Importante salientar que há uma vasta gama de espetáculos existentes no país, logo, se o consumidor opta por assistir a um determinado show, musical, espetáculo teatral, submete-se ao pagamento do valor do ingresso previamente estipulado e informado, da forma como preferir.
Tal prática, no nosso entendimento, deve ser analisada sob o viés da liberdade de escolha. Vejamos.
O Professor Rogério Donnini define venda casada como a prática “em que o fornecedor procura submeter, mediante um ato de condicionamento, o consumidor à aquisição de outro produto ou serviço, diverso daquele escolhido, para que possa comprar o originalmente pretendido.” (Revista dos Tribunais | vol. 999/2019 | p. 347 - 366 | Jan / 2019 | DTR\2018\22791).
No caso em comento, o consumidor possui duas opções para adquirir o seu ingresso, sendo: (i) deslocar-se até um ponto de venda autorizado; gastar com transporte e/ou estacionamento; enfrentar trânsito e aguardar por horas na fila e, sem contar, na possibilidade de esgotamento dos ingressos, após realizar todo este trajeto; (ii) permanecer em sua residência, no trabalho ou em qualquer outro lugar e acessar de seu celular ou computador, aplicativo ou site da empresa, com toda comodidade, verificando, de pronto, a disponibilidade do ingresso pretendido.
É importante mencionar que os eventos, no geral, possuem uma Bilheteria Oficial para compras realizadas diretamente pelo cliente e que não enseja a cobrança da taxa de conveniência, que pode ser um ponto de venda, por exemplo, ou ainda, a própria bilheteria do local onde será realizado o espetáculo, show ou evento.
Logo, quando o consumidor se dirige ao ponto de venda, como a Bilheteria Oficial do evento, não há a cobrança da chamada taxa de conveniência. No entanto, quando opta pela compra do ingresso pelo aplicativo ou site, é nítido que optou pela comodidade, pois não precisará se deslocar até o local de compra do ingresso físico e optou por adquirir de uma empresa que presta esse serviço para ele.
Se o consumidor possui duas formas de adquirir o ingresso, é ele quem escolhe aquela que melhor atenderá os seus requisitos, razão pela qual, em nosso entendimento, há liberdade de escolha e, portanto, com o respeito à Ministra, não há que se falar em venda casada, pois a compra do ingresso não está condicionada, exclusivamente à venda online, na medida em que pode ser adquirido diretamente na bilheteria oficial.
Ora, o consumidor, uma vez interessado no espetáculo, possui algumas possibilidades de escolha para adquirir o seu ingresso, optando pela forma que mais lhe agradará.
Desta forma, entende-se que a liberdade de escolha está preservada porque o consumidor não é obrigado a adquirir o seu ingresso online e, quando opta por realizar a compra online, acaba pagando pelo diferencial do serviço.
Além disso, conforme disposto no artigo 6º, III, do CDC, é um dever do fornecedor prestar “informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.”
Seguindo esse entendimento, no presente caso, não há qualquer afronta ao dispositivo mencionado, na medida em que a empresa deve detalhar cada um dos produtos/serviços oferecidos, bem como o preço que compõe cada um deles – quando da aquisição de um ingresso, por exemplo - o que, nesta situação, verifica-se que há sempre a menção do valor pago pelo ingresso e pela mencionada taxa de conveniência, ambos devidamente discriminados.
Sendo assim, de acordo com nosso entendimento, inexiste venda casada, mas, liberdade de opção do local para aquisição, bem como informação prévia e clara sobre o preço do produto (ingresso) e do serviço (aquisição online e não presencial).
Nayara Teixeira Ferreira
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